Como um cristão deve encarar dilemas emocionais ? Vamos falar de depressão ?

Como um cristão deve encarar dilemas emocionais ? Vamos falar de depressão ?

Enquanto a ansiedade se ocupa majoritariamente com o futuro, a depressão foca sua atenção no passado. Desde agora de início eu quero te sugerir procurar terapia, caso esteja lidando com pensamentos e sentimentos deprimidos. O meu texto não tem a intenção de ser uma intervenção profissional, então não deixe de procurar um profissional caso você esteja passando por algo que tem tentado lidar sem conseguir.

Uma breve experiência

Assim como fizemos no texto da ansiedade, gostaria de começar com um exercício:

Dedique alguns segundos a pensar ativamente sobre seu passado, lembranças, memórias. Você está satisfeito com as decisões que tomou? O caminho que te trouxe até onde sua vida está nesse exato momento, valeu a pena? Enquanto pensa sobre seu passado, também permita que sua atenção esteja um pouco presente, na sua experiência, suas sensações. Quais pensamentos passam pela sua mente? O que seu corpo sente quando se lembra? Mesmo que seja tentador, tente não ficar lá por muito tempo, ainda temos um texto pra continuar aqui e agora.

É bem provável que durante esse exercício, sua mente tenha te levado a ocasiões específicas, relacionamentos específicos. Talvez dinâmicas que te magoaram ou escolhas que você gostaria de fazer diferente. Talvez também você tenha se alegrado, sorrido. Talvez fisicamente você tenha sentido um frio na barriga só da possibilidade de responder minhas perguntas com frustração ou culpa. Até mesmo eu que escrevo esse texto enquanto tomo café com o João sorrindo na minha frente, o som da panela de pressão com o feijão cozinhando e uma boa música da Rita Springer tocando no fone, percebo em mim uma leve sensação de angústia sem nome, sem endereço, sem causa aparente. O dia está indo bem, mas por alguma razão enquanto coloquei o passado em questão, alguma melancolia tomou um espaço maior em mim. Digamos que eu tenho um certo apreço a essa melancolia, mas às vezes, confesso, que não quero ficar muito tempo com ela porque tenho receio de que ela me atrase. Sou vulnerável e nesse momento me sinto ainda mais vulnerável, será que estou sendo dominado pela depressão?

Depressão e seus caminhos

Algumas das principais características da depressão são humor persistentemente deprimido, perda de interesse ou prazer em quase todas as atividades (mesmo as que antes eram consideradas agradáveis), alterações no apetite e peso, alterações do sono (sono excessivo ou insônia), fadiga, sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva, dificuldade de concentrar, agitação ou retardo psicomotor e em casos mais graves, pensamentos recorrentes de morte ou suicídio. Em um sentido comportamental, a depressão pode ser vista basicamente onde aquilo que me trazia satisfação deixou de existir, mudou sua função ou porque ainda está ali, mas eu não tenho habilidades suficientes para alcança-lo. Por exemplo, pensemos sobre uma cantora de sucesso que lida com sentimentos deprimidos em três possíveis situações:

  1. Perdeu sua voz; (o reforçador não está mais presente)
  2. Após críticas frequentes, se sente insegura de cantar, mesmo sua voz tendo sido muito elogiada em sua história; (o que antes a reforçava agora tem uma função aversiva)
  3. Em sua carreira ela agora precisa de habilidades que vão além da voz como conexões com produtores, outros artistas, exigindo habilidades relacionais que antes ela não investiu. Ela ainda tem voz e o apreço do público, mas a carreira começou a exigir mais habilidades do que ela desenvolveu.

Isso de uma forma MUITO resumida, resumida até demais…

Quando a vida imita a vida e a arte faz o mesmo

Uma história exemplo da combinação desses é o que ocorreu com Celine Dion, após o diagnóstico de uma doença muscular crônica, ela precisa lidar com um desafio para o qual não se preparou (não que seja possível uma preparação pra uma situação como essa). Agora enquanto canta, sente dores frequentes e não consegue investir na mesma proporção como sempre investiu. A doença começa a consumir seus reforçadores e sua vida começa a entrar em uma reviravolta angustiante. A história dela é também exemplo de como alguém pode encarar o incontrolável e ainda encontrar algum tipo de força pra continuar vivendo. Uma reviravolta maior ainda.

Entrando um pouco no conceito filosófico da coisa, gosto de citar a série Dark para exemplificar uma luta constante com o tempo. Os personagens viajam inúmeras vezes ao passado e futuro como uma tentativa de realinhar o presente, mas quanto mais eles viajam, mais desalinhado a linha temporal fica e mais ramificações o tempo cria, alguns personagens inclusive ficam presos em outra época e nunca mais voltam. No final das contas é uma corrida exaustiva e pouco presente. Nessa corrida, nossas mentes tentam nos fazer engajar com maior frequência do que gostaríamos.

Eu particularmente não tenho uma história com a depressão em mim mesmo, na minha pele (mesmo que uma história de muita melancolia), mas me lembro de vários momentos onde pensei demais e principalmente com um receio de não ser feliz o quanto deveria. Receio da insuficiência e impotência. Receio de não ser bom o bastante para enfrentar tudo que a vida nos desafia, receio de sofrer. Eu acho que entre a ansiedade e depressão, sou mais tentado a flertar com a depressão, em certo aspecto, eu temo mais a ela do que à ansiedade. Já houve um tempo que eu tinha um receio de encontrá-la no futuro. Isso me fez perder muito tempo e sobrecarregar muitos relacionamentos.

Poderíamos gastar incontáveis parágrafos sobre histórias e exemplos, mas esse não é exatamente o ponto, porque o propósito era eu dizer como lidar, eu sei.

Enquanto olho pra trás, não consigo olhar pra qualquer outro lado

Estamos já há algum tempo falando sobre tudo que a depressão causa e sobre o que a causa, mas enfim, como lidar? Como lidar com as possibilidades dos caminhos que eu não escolhi? Como lidar com a culpa? Como lidar com aquele pecado que eu cometi? Como lidar com a perda, com a mudança, como lidar com a minha própria insuficiência frente à vida que pretendo viver? É assustador e por isso muitas vezes podemos nos sentir paralisados em nossas decisões. Até mesmo aqui os “e se’s” podem entrar em uma dança sufocante entre “não quero jamais repetir o que aconteceu aquele dia”e o “ mas também não quero a possibilidade de encontrar por acaso no futuro”.  

O passado não conta toda a história

Os sentimentos e pensamentos sobre o passado também não são a principal causa da dor. Situações às vezes doem, às vezes doem muito, mas a maneira como lidamos com a dor pode pontencializá-la ou não. É inevitável sentir algum tipo de dor em algum momento e principalmente relacionada a algo que já aconteceu. No entanto, o presente e futuro, embora parte do passado, não são prisioneiros determinados por ele. O nosso passado diz sim muito sobre nós, mas ele não conta toda a história.

Olhando para a glória, posso descansar das minhas viagens no tempo

Nesse momento no meu fone a Rita Springer está cantando:

 “Let us become more aware of Your presence, Let us experience the Glory of Your goodness” (vamos nos tornar conscientes da Sua presença, vamos experimentar a glória da Sua bondade).

Eu acredito que esse convite por si só responda muitas perguntas. O passado é aquele tipo de lugar incontrolável, pois não temos como mudar 1cm sequer da rota que já fizemos, ele não volta, não importa quantas viagens façamos até ele, ele permanecerá lá intacto, no máximo, conseguiremos ressignificá-lo. Se você leu o texto sobre ansiedade, sabe o quanto o controle pode nos levar a exaustão. Aqui o princípio é o mesmo. Se olhar pra trás for inevitável, tente olhar um pouco também para o que esteve lá e pode trazer esperança. Um conselho eu dou: não gaste tempo demais olhando para trás se isso sacrifica o que está exatamente frente aos seus olhos, a não ser que o que esteja frente a você não seja exatamente o coerente com o que pretende viver, nesse caso, use o passado como um combustível para o ajustamento. Olhe para a glória, é o único lugar de real deleite e descanso.

A contemplação só acontece no presente

Reviravoltas podem acontecer enquanto notamos a culpa, a insatisfação, as lembranças e memórias, mas ao mesmo tempo vemos o hoje como uma boa possibilidade de viver.

A contemplação só acontece no presente, a nossa fidelidade também. Mesmo que olhar para cruz exija olhar pra trás, a minha atitude só acontece agora, se ela já aconteceu ontem, em breve isso envelhece, se acontecerá amanhã, eu pretendo, mas não tenho como saber. A cruz me livrou do medo, medo de mim, da morte, da dor. Eu ainda sinto medo. Todo o medo foi arrancado de mim, todo medo ainda está sendo arrancado de mim, todo medo ainda será arrancado de mim um dia, o qual será perfeito.

Tudo que é faltoso em mim, encontra lugar em tudo que é abundante em Cristo

Enquanto finalizo esse texto, percebo meu coração aberto e tranquilo. É como se eu tivesse percorrido com vocês uma jornada pelos parágrafos passando por sentimentos diversos e agora eu pudesse apenas descansar. Tudo que é faltoso em mim, encontra lugar em tudo que é abundante em Cristo.

Tire alguns minutos para perceber e contemplar a bondade. Você ainda vai olhar muitas vezes pro passado, mas ainda há muita esperança jorrando de Cristo.

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